domingo, 16 de julho de 2017 0 comentários

O Retorno de Lula (Publicado na Folha dos Lagos de 15/7)



Lula é o próximo presidente da república. O ato final de Moro era esperado. Não havia como não condenar o ex-presidente, pois a peça processual era teleológica, ou seja, desde o início já se conhecia o fim. O problema eram os meios, o recheio do bolo. Não conseguiu a robustez que impeça Lula de escapar, mais uma vez, ileso. Mesmo que todo e qualquer cidadão minimamente informado saiba que Lula também está no epicentro de toda a trama, o ex-presidente, cuidadoso, soube melhor do que os demais conservar-se quase intocável.

Moro o tocou de resvalo, mas não pensemos que vai além disso. Ao deitar a cabeça em descanso na Bíblia, ao fim do seu trabalho de algoz, talvez antecipasse ou vislumbrasse o fim ou os problemas que enfrentará na sua carreira de magistrado a partir do próximo ano com a volta de Lula ao poder. Se for vingativo, não deixará passar em branco todo o transtorno causado a si e aos seus. Se não for, ao menos não deixará Moro em paz.

Não vejo outro cenário do que a segunda instância inocentar o ex-presidente por falta de provas diretas, concretas e materiais, algo que Moro não conseguiu produzir com todo seu contorcionismo retórico e todo o conjunto de ilações que mais se ancoraram em presunções do de que propriamente em provas. Desse modo, não podemos esperar que uma segunda instância possa levar a sério uma decisão dessa natureza.

E com a absolvição, o tiro sai definitivamente pela culatra, pois se hoje ele já é imbatível em qualquer simulação, quando for inocentado, vai verdadeiramente incendiar o país com toda a força do seu poderoso discurso e sua indiscutível habilidade política, atacando as reformas, a pobreza, a estagnação, a perseguição dos seus inquisidores e, não estranhem, atacando a corrupção.

Quem morre definitivamente nesse cenário é o PSDB. Viveu um conto de fadas com Aécio. Viu a carruagem tornar-se abóbora e pode piorar ainda mais com o progressivo esvaziamento de suas lideranças no cenário nacional. Pelo mesmo caminho irão os que não conseguirem dialogar com Lula e a conversa começa agora.


Assim, a Lava-Jato começa a ficar muito estranha. Antes acreditava-se que se tratava de uma ação para livrar o país da corrupção. Agora mais parece uma limpeza que é feita quando uma quadrilha desanca a outra para ocupar ou reocupar o território dos ilícitos. Seja como for, somente o Executivo e o Legislativo foram expostos e sangrados. E a própria operação vem mostrando que mudança de verdade, só ocorrerá quando chamarem o Judiciário às falas. Enquanto isso...
domingo, 9 de julho de 2017 0 comentários

Progressiva Descrença (Publicado na Folha dos Lagos de 8/7)



Não acreditar é uma das mais difíceis e dolorosas experiências. Creio que a infância do gênero humano é essencialmente crédula. Acreditamos por necessidade de estabelecer sentidos, compreender esse fenômeno complexo chamado “vida”. Por esses caminhos, fomos apresentados ao longo das eras às entidades astrais, às forças naturais, aos deuses humanos e sobre-humanos, a deuses vários ou a um único e soberano criador.

Mas não é só de re-ligações que vivemos a experiência de crer. Desenvolvemos a crença nas pessoas e naquilo que um conjunto de pessoas constrói. Assim nasceram nossos exemplos, nossos referentes, e as diferentes perspectivas de compreensão de como as coisas são ou deveriam ser.

Ao longo do tempo, oscilamos o destino dessas crenças. Já fomos fervorosamente crédulos pela leitura do maravilhoso como construtor da realidade. Já revertemos essa polaridade, colocando as coisas como condição de saciedade e complementamos, por antítese, essa mesma materialidade na forma de estopim revolucionário de uma modalidade comunal. No meio de tudo isso povoou a imaginação, as mentes e corações, os mais célebres e influentes seres humanos. Ou seja, já vivemos tempos de inspiração, seja pela fé, pela ciência e técnica, ou mesmo pela verve e lavra do pensamento de homens e mulheres de luta.

Hoje somos descrentes. Talvez porque se cumpra nos tempos atuais alguma espécie de maldição ancestral (ou pecado original segundo leituras outras...). Ou porque cotidianamente somos forçados a não acreditar em mais nada e nem em ninguém. Razões para justificar esse comportamento são fartas. No campo das religiões, o charlatanismo, as alegorias, adereços e devaneios das corporações da fé, ávidas em produzir uma indústria pródiga em vender a diferentes preços tudo o que o capitalismo nega em seu corte de classe: saúde, riqueza e fama.

Tampouco acreditamos nas pessoas. Nos políticos então nem se fala. Motivos também são fartos e é quase fato consumado que são raríssimas, escassas, quase míticas as possibilidades de renovarmos o atual estado de coisas, pois as caras novas são, não raro, apenas a pele que cobre o corpo nefasto da continuidade de práticas e pensamentos que, em seu todo, são a razão do nosso descrer.


Mas ainda há uma luz no fim do túnel. E ao escrever isso admito a crença ao invés do descrer. Isso porque ainda existe ou resiste a arte, a literatura, a pesquisa, as crenças que aliam a mística do incompreensível à compreensão da experiência dramática da humanidade. Mas é forçoso reconhecer que essa luz é um fósforo em meio ao vazio das trevas. Mas já ilumina algo. E é isso e isso apenas o que temos para começar a transformação. O resto é combustível.
terça-feira, 4 de julho de 2017 0 comentários

Três Lições (Publicado na Folha dos Lagos de 2/7/17)



Recentemente pude aprender algumas lições em política, afinal, ela é dinâmica. Para conquistar a consideração do distinto leitor e a brandura da diagramação deste espaço, vou nominar apenas três.

A primeira lição é a de que qualquer transformação só pode surgir do processo revolucionário. Desconsiderando momentaneamente sobre qual lado político a promova e se virá pela mudança radical de pensamento e comportamento ou pela via da força, o que nos importa nesse breve instante é a afirmação de que os poderes constituídos são centrífugos e tendem a conservação. Observemos bem as estratégias do Planalto e de seus aliados, bem como de todos os políticos e demais envolvidos com os malfeitos contra a nação e a República, e vamos concluir que as peças estão se movendo rumo ao acerto das arestas. Se as investigações não podem retroagir, podem ser impedidas, sustadas, arquivadas, desconsideradas, negadas e, para isso, basta que se coloquem as pessoas certas nos lugares certos em defesa do errado.

Já não resta muita dúvida que as recentes modificações na Procuradoria Geral da República, bem como do comportamento da base parlamentar vá dar ao país um desfecho diferente do que imaginamos, a vitória do argumento de um país cambaleante que precisa de paz para ser reformado. O problema é que toda e qualquer reforma, no momento, é como uma demão de cal rala em paredes tomadas de mofo e podridão.

A segunda lição recente, e que deve ser aprendida rápido por quem tem apetite em política é de que não existe fila. O político que espera sua vez na fila para lutar pela possibilidade de ver seus ideais concretizados em mandato está fadado ao ocaso precoce. Toda e qualquer fila é um arranjo provisório e desconsidera a dinâmica dos fatos e, não raro, presta-se mais ao serviço da formação de dinastias do que propriamente a oxigenação, crescimento e fortificação de grupos políticos.

A primeira conhecemos bem, os processos dinásticos das famílias políticas, dos coronéis que exerceram o mandonismo nos campos e nas cidades. O resultado quase sempre não acaba bem. Ao menos para o povo, com plena certeza. Já a oxigenação faz um grupo crescer e prosperar. Para isso basta deixar que a política faça seu trabalho, pois ela mostra de fato qual candidato possui as condições para ser a nova liderança. E quanto mais se antecipa esse destino mais se mostra a fragilidade do nome posto, pois precisa desesperadamente ser inflado mais pela mão que ameaça o tapa do que a mão que afaga e conquista.

Exemplo maior disto é a crise pelas quais os partidos que tinham seus presidenciáveis consolidados – vários deles na base da “marra” – e que com os recentes escândalos já podem ser considerados cartas fora do baralho. E como os grupos e partidos gastaram precioso tempo em movimentos de conformação com seus fatos consumados, agora se remoem de modo caótico em busca de figuras que possam ser adesivadas no coração do povo. Não é fácil. O PSDB que o diga.


A terceira e última lição é a de que cada político paga o preço por quem escolhe para assessorá-lo. As delações mostram fartamente as mochilas, malas e outras tantas artimanhas que, em nome dos políticos ou a mando deles, se fazem no troca-troca criminoso do tráfico de influência. E tapear um político parece ser tão fácil quanto ele tapear o povo. Se assim não fosse, não teríamos tanta gente ruim e desqualificada sendo incensada como gurus e mentores, bem remunerados. É hora do político voltar a ser o protagonista do elenco.
 
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