domingo, 22 de abril de 2018 1 comentários

Educação Finlandesa (Publicado no Jornal Folha dos Lagos - Edição de 21/22 de abril)



Quando o assunto é educação geralmente temos orgulho e surpresa em olhar para experiências bem sucedidas no exterior. Depois de tempos de louvor ao modelo sul-coreano, a vedete do momento torna-se a Finlândia. Não é para menos. O país nórdico encontra-se sempre nas primeiras posições do Pisa, avaliação internacional que mede o nível educacional de jovens de 15 anos nos países-membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Quando entrevistados, professores, alunos e gestores são unânimes quanto a uma palavra: Valorização. Infelizmente no Brasil a palavra valorização é desconhecida em seu sentido original. Confundimos valorizar com gostar, respeitar, falar bem. Para os finlandeses esse não é um sentido atribuído mas uma conseqüência do que, de fato, é valorização.

Valorizar é agregar valores. Parece óbvio mas é completamente diferente do que praticamos aqui. Podemos elencar o receituário deles, falando sobre o fato de praticamente toda a educação nacional ser pública e possuir padrões salariais altos para docentes, estimulando a carreira. Podemos prosseguir mostrando que suas escolas são bem equipadas, com horários compatíveis com a rotina cultural e biológica dos jovens e com currículos atualizados e ensinados de modo inovador. Podemos ainda insistir mostrando que seus gestores são pessoas que entendem, de fato, de educação. E concluir com uma cultura nacional que valoriza a educação e a escolaridade sob a forma de oferta de empregos bem pagos para quem se dedica a vida escolar e acadêmica. 

No Brasil achamos que copiar modelos é a chave do sucesso. O problema é exatamente esse, o de reduzir uma experiência social complexa, como a da Finlândia, para que se transforme em um “manual pedagógico” a ser costurado como o monstro de Frankenstein em nossas partes decompostas. Lá a educação não se tornou peça retórica para politicagem vazia, não se concebe por doutrinação social em favor de ideologias particulares e nem como uma mera pré-condição obrigatória perante a legislação. Lá há uma compreensão ampla, holística da educação como princípio de toda a organização social, cultural e econômica. A política, nesse sentido, cuida para que esses três pilares permaneçam sólidos.

Enquanto por aqui convivermos com a politicagem com a educação, transformando-a em mecanismo compensatório do empreguismo simplório, da outorga a gestão das pastas educacionais a notórios despreparados e do tratamento estrutural baseado na precariedade, no jeitinho, no adaptado, não seremos Finlândia. Enquanto nos preocuparmos mais em gerar pilhas e mais pilhas de documentos, diretrizes, resoluções, parâmetros, portarias, marcos e todo um aparato monumental de instâncias e vigias, tudo para conferir se a precariedade vai em boa ordem, não seremos Finlândia. Enquanto nossos políticos e  gestores de pasta tratarem a questão salarial do docente como uma piada de mau gosto, enquanto lançarem mão da prepotência, arrogância, ou mesmo da falsidade, fingindo compreender e estar ao lado de quem, na verdade, combatem com todas as forças para que seus privilégios pessoais permaneçam intocados, não seremos Finlândia. Enquanto o mercado, a economia não valorizarem monetariamente o estudo, estancando a exploração em nome do lucro, pagando cada vez menos aos mais escolarizados, desencorajando carreiras, não sermos Finlândia.

Seremos nós. O Brasil orgulhoso da sua educação pouca para muitos e seletiva, para poucos.

domingo, 15 de abril de 2018 0 comentários

Mudar para Permanecer (Artigo publicado no Jornal Folha dos Lagos de 14/4)


A política em nossas terras tem a peculiaridade de se modernizar de modo conservador. Dito em outras palavras, o que é inovador em nossas práticas tem apenas a forma, a aparência e o nome. No fundo, muda-se para conservar.

Um bom exemplo, para não dizer lição, pode ser aprendido dos nossos livros de história. Vivemos uma república que prometeu, na forma, ser a vanguarda transformadora de um império caduco, atrasado, com o ranço aristocrático dos “casacas”. Entretanto, deixando aqui as devidas ressalvas ao modelo de governança monárquico (o qual não tenho real apreço), podemos observar um fato curioso: Um imperador se aproximando de uma nova elite urbana e empreendedora, a abolição do trabalho escravo tendo em vista uma progressiva transformação das relações de produção, entre outros sonhos dourados que acalentavam um desejado Terceiro Reinado.

Mas aí veio a república, filha unigênita de uma quartelada do exército, misturada em menor parcela com as tintas quase inexpressivas dos ditos “pensadores” liberais. De liberal o movimento teve pouca coisa, de fato. Até porque não foi essa gente que pariu a criança nova da mudança, foram as camadas agrárias, escravistas, conservadoras, que sustentaram e, assim que puderam, tomaram o governo aos goles de café com leite, raivosas pelo abandono de Sua Majestade.

Ou seja, enquanto na Europa os movimentos republicanos vinham acompanhados do engajamento e participação popular e de uma efetiva transposição de poder e de concepção de Estado e de governo, nas Américas coube aos elementos mais conservadores realizar, com alguns pares apenas, a mudança de tudo que ameaçasse mudar o seu mundo.

Hoje sofremos desse mesmo mal. Há pouca mudança no horizonte. Vejamos o caso da prisão do ex-presidente Lula. Não há como esconder a seletividade de uma justiça que faz política. O jogo é para prender uns, soltar outros e inocentar centenas ou milhares. É a mudança que não muda, apenas rearranja o jogo. Mas daí a acreditar que Lula é um mártir inocente vai uma distância colossal. Negar que ele não esteve no epicentro de um sofisticado esquema de cooptação e corrupção generalizada envolvendo agentes públicos e privados é de uma ingenuidade quase infantil.

Agarrar-se a tese de que ele não é um homem falível e corruptível mas sim uma “ideia” que tirou milhões de brasileiros da pobreza, é assumir que a esquerda brasileira não é lá muito diferente da direita nas suas práticas, apenas mais eficiente nos seus efeitos. Sintetizar as possibilidades da esquerda no “lulismo” é inaugurar uma síndrome de Robin Hood (desconsiderando ainda que os ricos em seu governo não foram “roubados e nem sequer incomodados...). Pior é reduzir a crítica ao novo deus imolado de puro fascismo... É nessa hora que nos tornamos o que combatemos.

 
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