segunda-feira, 7 de maio de 2018

Lições Políticas (Publicado no jornal Folha dos Lagos, edição de 05 e 06 de maio).




Por volta de 1830 a Inglaterra já fervilhava com os desdobramentos da Revolução Industrial.  Se por um lado o país se desenvolvia economicamente de modo acelerado, por outro ainda sofria com os desequilíbrios tanto inerentes ao novo sistema político/econômico. O problema da representatividade era um deles. Os distritos industriais mais desenvolvidos tinham uma representatividade parlamentar inferior  a de localidades com ínfima população e baixa relevância econômica. O proletariado, nesse tempo, não podia votar nem ser votado mas, como lhe interessava os possíveis benefícios de uma representatividade indireta, alia-se à burguesia em prol da Reforma Política. Com a vitória da proposta, foi abandonada pela mesma burguesia que apoiou. Aprendeu a lição. Os pactos entre o capital e o trabalho são frágeis como cristais. A conseqüência disso foi a criação do Movimento da Carta que, junto com os sindicatos, percorreu o país pedindo direitos trabalhistas como a redução da jornada de trabalho para 10 horas diárias e, entre outras demandas, o direito de votar e ser votado. Para isso, era necessário que os representantes eleitos pelo povo pudessem ter como se sustentar. Naquele momento a função parlamentar não era remunerada, possibilitando apenas que os mais abastados, de fato, controlem o poder.

Hoje ainda temos certas ilusões em nossa democracia. Trago à luz pelo menos três. A primeira é a de que ser remunerado para o trabalho político é algo errado. Não é. De fato, como na luta inglesa dos séculos passados, é o que possibilita que as pessoas possam dedicar seu tempo tendo em contrapartida como se manter já que suas atividades pessoais ou são impedidas ou restringidas por questões legais ou de mesmo de tempo. Acreditar que a política deveria ser gratuita é assumir implicitamente que só os mais ricos, que são donos de seu tempo, podem ocupar funções públicas. O problema são os excessos, as distorções e a mazela da corrupção. A segunda é a crença de que a gestão pública deve ser entregue ao setor privado através de seus partidos e representantes. A afirmação de que a gestão pública deveria ser como a de uma empresa é algo que só pode ser dito por quem desconhece por completo a teoria e a natureza prática da administração. É como voltar ao modelo parlamentar burguês da aurora do capitalismo, ou seja, quem controla o capital passa a gerir o Estado conforme os seus interesses imediatos. A relação dos empresários com o Estado, no nosso país é um tanto estranha. O Estado é visto como madrasta, como inimigo do crescimento. Entretanto, as renúncias e incentivos dados pela “viúva” são maiores do que todo o orçamento deste ano das pastas da saúde e educação. Nada mal.

O terceiro é a de todos os políticos são corruptos e a política é algo detestável de modo geral. Essa crença é a mais perversa. Ela afasta as pessoas qualificadas e mais capazes para contribuir para a gestão e desenvolvimento da coisa pública. Investir com salários e carreiras atraentes no setor, diminuindo o tamanho e o alcance da montagem paralela das estruturas de governo pode ser uma saída interessante. Mas precisamos ainda dar nosso voto de confiança. Não a anjos posto que não existem encarnados. Temos bons políticos que estão na luta para que as boas práticas prevaleçam mas é preciso atenção redobrada pois nessas horas surgem o moralismo fascista, vazio e violento e a tecnocracia esnobe, fria, sociopática. E eles tem adeptos até mesmo nas camadas que são seus alvos prioritários.

E, por fim, não deixarmos de votar. Nunca. É uma conquista histórica, lenta e que tem as cores do sangue dos mais pobres.

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