Não é novidade para nenhum
brasileiro que estejamos vivendo momentos de crise. Entretanto, tenho me
perguntado a razão pela qual concentramos nossos esforços apenas no que tange
os indicadores e, sobretudo, nos arranjos que possibilitam meramente o retorno
de uma situação indesejada para um tempo que, se não era melhor, pelo menos
oferecia certa previsibilidade.Na minha opinião isso é pouco. Muito pouco. O
econômico prevalece tendo em vista o enfrentamento de atrasos salariais,
rombos, desvios , fraudes e toda sorte de problemas ocasionados pela gestão
temerária que contava, até os dias em que a justiça dormitava, com a quase
certeza da impunidade. Os tempos são outros, mas as soluções parecem ser as
mesmas. Ao invés de aproveitarmos os momentos ruins como alavancas criativas
para a inserção de nossa sociedade no século XXI, voltamos às velhas práticas
messiânicas, dos salvadores personalistas e de modos de se ratear o poder de
maneira a que os esquemas de sempre se camuflem ou na discrição ou na pele
imberbe das novas caras, filhotes diretos ou indiretos das velhas raposas.
Por isso me arrisco a dizer que
não estamos numa única crise. Estamos vivenciando um conjunto de crises
sobrepostas. A econômica talvez seja a mais auto evidente, mas temos outras de
tamanha importância como a crise na ordem dos valores. Elementos estruturantes
de qualquer sociedade, os valores que notoriamente necessitam ser redescobertos
e ressignificados com urgência, como a solidariedade, a fraternidade, a ética,
a honestidade e o respeito, poderiam ser o alicerce ou mesmo o estopim de uma
explosão revolucionária da condição do ser humano. Mas nós só discutimos números e indicadores.
Não há como pensar uma saída
definitiva para crise sem assumirmos um compromisso com a redução da pobreza e
da desigualdade. A pobreza é estruturante também, pois cria mecanismos muito
difíceis de serem superados pelo mero esforço pessoal. E esse cenário piora ainda mais quando
mesclado com outras condicionantes como a violência. A saída da pobreza não
será unicamente pela porta do consumo facilitado, que mais endivida do que estabiliza.
Ainda que o consumo seja um fator importante, o que está por trás dessa relação
é a posse de algo como objeto de reconhecimento social. Em outras palavras, nós
compramos algo para existir para o outro. Sob esse prisma dá para pensar na
quantidade de pessoas que hoje não existem ou estão tentando se tornar
visíveis.
A educação, obviamente, é uma das
saídas permanentes para o conjunto das crises. Entretanto, ainda temos uma das
mais arcaicas do mundo contemporâneo. Nossa incapacidade de gerar pensamento
teórico e metodológico compatíveis com as demandas atuais só perde para nossa
gestão, ainda aferroada a práticas que pouco diferem do
matriarcalismo/patriarcalismo. Enquanto oferecermos aos planos politiqueiros a
prerrogativa de nomear os condutores dessa instância, sofreremos
terminantemente com o atraso, com o improviso ou, o que é pior, com o tipo de
gestor que, viciado em redes sociais e mídias, anuncia uma chuva de reuniões,
iniciativas, projetos e tratativas, sem que nenhuma produza efeito. É a
sociedade do espetáculo onde o estar fazendo (quantitativo) é visto como sinal
de produtividade, mesmo sem nenhuma efetividade. Se desejarmos deixar de ser um
ponto fora da curva do progresso e do desenvolvimento, teremos que repensar de
modo mais holístico o que chamamos de crise e tentar solucioná-las com algo que
é valorizado em qualquer país desenvolvido, as pessoas, os valores e o conhecimento.
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