sábado, 30 de dezembro de 2017 0 comentários

Ano Novo? (Publicada no jornal Folha dos Lagos de 30/12)


O que esperar para 2018? Creio em particular que seja um ano com pelo menos duas grandes tendências: A de consolidar a mesmice ou acender a fagulha de uma transformação mais intensa. Para a primeira opção pesa a história. Corrupção e crise não são novidades e as pessoas aqui tem o mau hábito de apenas perceber uma em função da outra. Ou seja, apenas em momentos de crise é que a corrupção é percebida como algo nocivo. Quando ela é vencida, a corrupção volta ao patamar do aceitável. Na verdade quando as pessoas estão minimamente satisfeitas com o que tem, os malfeitos na coisa pública são notados ou como uma regra do jogo inevitável ou como algo que um dia, quem sabe, pode vir a beneficiar direta ou indiretamente.

Desse modo, não acredito que tenhamos surpresas nas eleições desse ano caso a crise comece a melhorar. Os grupos políticos, mais especificamente os construtores de dinastias, sabem bem que para o eleitor, quando este está levando uma vida normal, basta apenas um dinheiro e algumas promessas. Em suma, melhorando o cenário, vamos assistir embasbacados campanhas de deputados dinásticos turbinadas por vários segmentos da população que antes clamavam por mudança. Mas se a crise não melhorar esses grupos terão mais dificuldade. Aí nem o dinheiro resolve o problema. Vamos então torcer pela crise prolongada? Tentador. Mas não é o caminho.

Só que para haver a melhora é preciso projeto, estudo e inteligência. Três coisas que geralmente os governos tem pouquíssimo ou nenhum apreço. As máquinas públicas se tornaram algo estranho. Precisam responder aos sinais dos tempos, sobretudo os agudos, mas ao mesmo tempo manter a estrutura que sempre fizeram as coisas ser como são. Nessa conta, sobram iniciativas individuais aqui ou acolá mas sem articulação, sem fazer parte de uma visão maior... Fazer administração pública hoje se tornou uma colcha de retalhos, em partes você encontra seda, em outras, pano de saco. No final, o cobertor fica estranho, irreconhecível, as vezes imprestável.

A chance de mudança passa por essa reflexão. Teremos a oportunidade de usar os melhores quadros, entre futuros eleitos e futuros trabalhadores na coisa pública, sem que o critério seja o de pertença a grupo tal e qual. Isso é primário e estúpido. Até porque muitos bons quadros se tornam meros bibelôs. Estão lá para que se possa, quando necessário, dizer que estão. O chamado verniz. 

Oportunidades mesmo, sempre são dadas aos que se dispõem aos esquemas fisiológicos, aos que não se importam em ser fantoches, aos que só querem um bom salário e não se preocupam minimamente com o sentido da palavra servidor. São para os que conseguiram juntar votos ou a promessa deles. Uma confederação de menos capazes.

Só que os tempos pedem os melhores. Que tenhamos a coragem de dar a eles a oportunidade de fazer o que podem. Para isso, não basta desejar, mas construir um 2018 de competência e de diálogo.


Feliz ano novo.
sábado, 23 de dezembro de 2017 0 comentários

Feliz Natal (Publicado no Jornal Folha dos Lagos de 23/12)



Historicamente o natal é comemorado como uma festa cristã. Estima-se que mais de dois bilhões de pessoas estarão, no próximo dia 25, relembrando o nascimento de Jesus de Nazaré. O que nem todos sabem é que esse conjunto de referências que envolvem a data não pertence de modo direto aos seguidores do divino aniversariante e, em tempos de intolerância e esquecimento dos diferentes modos de nos religarmos a tudo o que nos cerca, vale a pena um papo histórico para acompanhar os festejos.

A começar pela própria data. O nascimento de Jesus não chega a ser nem uma estimativa e sim uma definição apriorística. Por volta do ano 200 definiu-se a data de 20 de maio. Mais a frente, 180 anos depois, a data passa a ser a que hoje tradicionalmente é celebrada: 24/25 de dezembro. E por quê? Na primeira data citada, o cristianismo era uma seita ilícita nos domínios de Roma. Antes da segunda data um fato memorável definiria a virada do jogo: A conversão do imperador Constantino em 312. De seita ilícita a permitida e encorajada, a religião moral passou a ganhar adeptos em escala. O próprio imperador, no dúbio papel de chefe da nascente Igreja Cristã e de expoente máximo do paganismo, sintetizou o que seria a tônica dali por diante, o sincretismo que aos poucos traria as crenças e práticas populares para o seio da cristandade. Lembrando que o termo “pagão” designa as pessoas simples, do campo ou ligadas a terra.

Então vamos lá. Em 25 de dezembro era celebrado o Yule, o solstício de inverno no hemisfério norte (e celebrado o sol de verão no sul...), festa muito popular no paganismo. Mas não só. Era um dia atribuído ao deus Mitra. O culto de mitra era tão disseminado quanto o cristianismo no período, sobretudo entre os soldados romanos. Curiosamente, o mitraismo era uma religião de estrita moral, de um deus (Mitra) que nasce de uma virgem e a ele é atribuído o domínio do sol invicto, a coroa do mundo e que é visitado por magos nesse dia... Além disso, o mitraísmo tem como ponto culminante de sua ritualística uma ceia com pão, água, vinho e carne, teve doze discípulos, fez muitos milagres, era branco de olhos azuis e cabelos compridos, morreu e ressuscitou três dias depois...

Dar ou trocar presentes – algo que hoje atribuímos ao espírito do capitalismo – também era uma prática pagã atribuída a deusa romana Strenia. Assim como a popular árvore de natal! Nos diferentes tipos de paganismo a árvore simboliza a fertilidade, a vida, firmeza, longevidade, sabedoria e ancestralidade. Nos festivais, troncos cortados ou mesmo as grandes árvores como pinheiros, freixos, seixos e outros eram enfeitados com pedras, ossos, frutas, etc... Há histórias do velho Odin visitando o mundo com seu cavalo de oito patas distribuindo presentes a quem deixasse doces nas meias.


Assim, não importa como você comemore esse natal. Apenas o faça lembrando do que nos torna tão humanos e fascinantes! Os valores de bondade, solidariedade, honestidade, gratidão e unidade. Que façamos nossos brindes, votos lembrando exatamente de tudo que é necessário, não importando o tipo da crença mas sim o que delas temos de melhor.
sexta-feira, 22 de dezembro de 2017 0 comentários

Mudança na Base (Publicado no Jornal Folha dos Lagos de 16/12)


O reconhecimento da educação como instrumento de cidadania e condição de empregabilidade parece ser consenso, ainda que o assunto seja pouco discutido ou, quando isso é feito, é de modo precário ou recheado de componentes de auto-ajuda. Já não é de hoje que os governos tratam burocraticamente dos temas relacionados à concepção de educação, lidando com ela como um porquinho no chiqueiro, ou seja, se tiver tudo ali, água, comida e lama o bichinho se vira sozinho.

A preocupação com a educação quase sempre é politiqueira. Quantos contratos, quantos empreiteiros, quantos indicados a posições de direção... Uma engrenagem que se presta exclusivamente a projetos de poder muito pessoais. Se há algum destaque, é por mérito de indivíduos e não por um projeto, uma visão, um plano que sabe de onde começa e para onde vai. No particular, ecos da meritocracia e das aprovações em testes como aferidores de uma pseudo-qualidade.

Assim é quase certo que os distintos leitores, apesar de certamente possuírem alguém familiar ou próximo ainda em idade escolar, desconhecem a recente aprovação da Base Nacional Curricular Comum, às quais todas as redes devem se adaptar até 2020, a partir do próximo ano. Apesar da preocupação dos conselheiros, é bastante provável que a concepção equivocada de sempre prevaleça nas redes, a de que a BNCC deve ser copiada e colada como um currículo obrigatório, coisa que não é. E não pode, por força da própria LDB, ser.

São vários pontos importantes. Com relação ao ensino religioso, ao que parece, um ganho a valorizar o diálogo produtivo com o conhecimento científico e a prevalência dos temas ligados a ética, filosofia e valores compartilháveis. O mesmo não se pode dizer da questão de gênero, ainda obscura e sem a divulgação final do texto que vai instruir como trabalhar com a temática. Mas ao que indicam os movimentos anteriores à votação, deve ser algo bastante geral e que provavelmente recairá sobre questões de respeito e tolerância. A alfabetização é antecipada e circunscrita aos dois primeiros anos do ensino fundamental, algo que quase sempre foi realidade na rede privada (que garante alfabetização efetiva logo na entrada desse segmento) do que na pública, onde “especialistas” teimam em alongar o “processo”, quase que “por toda a vida”... Não é a toa que o segmento público ainda tem essa imensa fragilidade justamente a partir dessa etapa. As competências, por sua vez, não trazem grandes novidades, mas cumprem bem a idéia de formação integral e holística, valorizando a articulação de saberes, da articulação ambiental e pelo multiculturalismo. Perfeitamente aplicáveis.

Tudo isso é importante demais para ser ignorado. É onde tudo começa. Mas esse começo tem gerado um fim obscuro: De acordo com dados recentes do IBGE aumentou para 28% o número de jovens que, em 2016, não estudam e nem trabalham. É sintomático e não deve ser interpretado como um dado isolado. A geração “nem-nem” é muito fruto do que a politicagem fez com a educação pública e do que a “plastificação” dos sistemas e apostilas fez com a privada. Somado a isso, os tempos de crise e falta de um “lugar no mundo” para essa garotada. Sobre isso vale a pena conversarmos numa próxima coluna.
sábado, 9 de dezembro de 2017 1 comentários

A Pergunta Certa (Publicado no Jornal Folha dos Lagos de 9/12/17)



O brasileiro é um povo tão intenso quanto efêmero nas suas atitudes. Basta acessar qualquer site de notícia, mídias convencionais e redes sociais para notar a enxurrada de denúncias, matérias, provocações, revelações, posicionamentos e comentários acerca das mais variadas modalidades de malfeitos. Entretanto, basta um piscar de olhos para que a indignação e o espanto coletivos se percam nas brumas dos memes, das notícias sobre a chegada de um evento, de um artista famoso ou da vitória do time favorito no campeonato tão importante.

Os maus políticos são como aquele personagem dos quadrinhos (agora também do cinema) que manipula o tempo e se utiliza da barganha como instrumento. Eles sabem que a impunidade é questão de tempo, preço e articulação. Pode ser realmente que o país esteja mudando de verdade. Pode ser que vejamos os maus políticos falharem em suas apostas na efemeridade da memória coletiva. Talvez consigamos viver tempos onde o dinheiro e o poder não serão mais capazes de produzir dinastias e organizações criminosas eleitorais.

Mas essa mudança que tanto incomoda os maus políticos tem partido de uma pergunta fundamental: 
Se você tivesse a oportunidade de garantir poder e muito dinheiro para você, sua família e um grupo próximo de amigos e com a capacidade de fazer isso durar bastante tempo, você o faria? Antes de responder, cabe acrescentar: Muito dinheiro significa comprar todo o luxo e o conforto de uma vida milionária, comprar a impunidade que fará com que tudo isso se mantenha, comprar pessoas, comprar sexo, comprar o que você quiser. E isso com o poder de montar um séquito de dependentes com os quais você poderá manobrar a vontade, pois a sobrevivência fará deles um corpo dócil de soldados mercenários. Você, com tudo isso nas mãos, o faria?

Durante muito tempo as pessoas tem respondido sim a essa pergunta. Tanto os eleitos, quanto os eleitores. Os eleitos pela certeza até então da impunidade e os eleitores pelo sonho de uma oportunidade de viver, pelo menos, um pouco como seus eleitos. Entretanto, algumas pessoas tem respondido não. E não estou me referindo às oposições políticas, pois o que as diferem muitas vezes da situação é a mera falta de oportunidade de fazer o mesmo. É surrado o discurso de que o erro do meu político é justificável e o do meu adversário não.  Falo dos que tem produzido denúncias, apurações, resoluções e exemplos de combate a tudo o que vem sangrando nossa sociedade.

Não estamos passando dificuldades em nossa pátria apenas por questões macroeconômicas. Passamos porque nossas opções estão incorretas. Mas enquanto a diferença entre nós e um político corrupto for o poder ou o mandato, pouco poderá ser produzido. De nada adiantará tanta indignação se nas eleições do próximo ano dermos o nosso sim para os que farão de tudo para que nada mude.


Mas a política não é um vale de lágrimas absoluto. Existe muita gente boa, honesta e preparada. Com vontade genuína de realizar em prol do coletivo. Só não se dá oportunidade e nem espaço para elas. São as pessoas que também respondem não e nós precisamos ter a inteligência de perceber que elas são o presente e o futuro. Elas não podem comprar votos ou posições, não são “bem cotadas” pelo olhar do jogo viciado da politicagem, só que é delas que mais precisamos no momento.
 
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