sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Mudança na Base (Publicado no Jornal Folha dos Lagos de 16/12)


O reconhecimento da educação como instrumento de cidadania e condição de empregabilidade parece ser consenso, ainda que o assunto seja pouco discutido ou, quando isso é feito, é de modo precário ou recheado de componentes de auto-ajuda. Já não é de hoje que os governos tratam burocraticamente dos temas relacionados à concepção de educação, lidando com ela como um porquinho no chiqueiro, ou seja, se tiver tudo ali, água, comida e lama o bichinho se vira sozinho.

A preocupação com a educação quase sempre é politiqueira. Quantos contratos, quantos empreiteiros, quantos indicados a posições de direção... Uma engrenagem que se presta exclusivamente a projetos de poder muito pessoais. Se há algum destaque, é por mérito de indivíduos e não por um projeto, uma visão, um plano que sabe de onde começa e para onde vai. No particular, ecos da meritocracia e das aprovações em testes como aferidores de uma pseudo-qualidade.

Assim é quase certo que os distintos leitores, apesar de certamente possuírem alguém familiar ou próximo ainda em idade escolar, desconhecem a recente aprovação da Base Nacional Curricular Comum, às quais todas as redes devem se adaptar até 2020, a partir do próximo ano. Apesar da preocupação dos conselheiros, é bastante provável que a concepção equivocada de sempre prevaleça nas redes, a de que a BNCC deve ser copiada e colada como um currículo obrigatório, coisa que não é. E não pode, por força da própria LDB, ser.

São vários pontos importantes. Com relação ao ensino religioso, ao que parece, um ganho a valorizar o diálogo produtivo com o conhecimento científico e a prevalência dos temas ligados a ética, filosofia e valores compartilháveis. O mesmo não se pode dizer da questão de gênero, ainda obscura e sem a divulgação final do texto que vai instruir como trabalhar com a temática. Mas ao que indicam os movimentos anteriores à votação, deve ser algo bastante geral e que provavelmente recairá sobre questões de respeito e tolerância. A alfabetização é antecipada e circunscrita aos dois primeiros anos do ensino fundamental, algo que quase sempre foi realidade na rede privada (que garante alfabetização efetiva logo na entrada desse segmento) do que na pública, onde “especialistas” teimam em alongar o “processo”, quase que “por toda a vida”... Não é a toa que o segmento público ainda tem essa imensa fragilidade justamente a partir dessa etapa. As competências, por sua vez, não trazem grandes novidades, mas cumprem bem a idéia de formação integral e holística, valorizando a articulação de saberes, da articulação ambiental e pelo multiculturalismo. Perfeitamente aplicáveis.

Tudo isso é importante demais para ser ignorado. É onde tudo começa. Mas esse começo tem gerado um fim obscuro: De acordo com dados recentes do IBGE aumentou para 28% o número de jovens que, em 2016, não estudam e nem trabalham. É sintomático e não deve ser interpretado como um dado isolado. A geração “nem-nem” é muito fruto do que a politicagem fez com a educação pública e do que a “plastificação” dos sistemas e apostilas fez com a privada. Somado a isso, os tempos de crise e falta de um “lugar no mundo” para essa garotada. Sobre isso vale a pena conversarmos numa próxima coluna.

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