domingo, 14 de maio de 2017

Futuro do Pretérito (Coluna de Sábado publicada na Folha dos Lagos - 13/14 de maio)



Existe uma perspectiva explicativa na física que é ao mesmo tempo fascinante e assustadora: o presente não existe. Melhor dizendo, ele até pode existir, mas não para nós, pois não conseguimos conhecê-lo no exato momento em que ele se produz. Os referentes que chegam aos nossos sentidos podem ter um atraso de um bilionésimo de segundo, o que o coloca necessariamente, no passado. A luz do sol que enxergamos é uma história de oito minutos que já se foram, assim como a luz de vários outros astros, alguns possivelmente extintos. É um destino surpreendente: quando acreditamos enxergar o futuro, é para trás que olhamos.

Talvez seja a história a tradutora por excelência dessa experiência para o campo das humanidades. É por isso que ousamos defender que ela ilumina o futuro, pois ao olharmos para o agora ou adiante, é o passado que enxergamos de fato. Alguns acreditam que ela nos dá lições. Não creio, mas professo a fé nos presságios e avisos. Se a história teima em não repetir o mesmo vestido e par de sapatos, o que podemos fazer é admirar sua beleza e com ela aprender por analogia.

Essa é uma maneira intrigante de pensarmos a realidade de nosso país. Num campo onde não temos como lançar mão de uma teoria elegante, tal qual um teorema, ou mesmo exata como um ciclo astronômico, resta-nos o material volátil do produto humano, sua maneira de perceber as coisas, de resolvê-las e, mais do que isso, de dar a ela sentidos e a partir deste, viver.

O embate entre Lula e Moro é o produto mais ridículo de algo que deveria ser levado a sério. Mas longe do produto inédito da história, nos deparamos praticamente com uma fórmula conhecida, talvez de química, onde certos elementos combinados sempre terão ao final a mesma substância. É hilariante acreditar numa perseguição política ao Lula. Comédia barata a presunção de seu desconhecimento de tudo o que apura a Lava Jato, assim como de sua digital em todos os cantos. E tudo nas mãos de um juiz pop star, com capa de super herói, trejeitos de salvador da pátria que, por onde passa, cumpre agenda política, praticamente de candidato.

O resultado de tudo isso não surpreenderá a ninguém. A corrupção não choca o brasileiro, apenas o entedia. As chamadas esquerdas estão niveladas a mediocridade da direita. Ambas se tornaram credos recheados de idolatrias, cada qual com seus santos e messias. Não mais do que dois caminhos são possíveis a partir do depoimento shakespeariano: no primeiro Lula é condenado, a Lava Jato prossegue, a república é refeita a partir do banimento da quase totalidade de safados com cargos eletivos e com mecanismos legais que impeçam o eleitor sem vergonha de voltar a eleger a safadeza; no segundo Lula é reconduzido a cargo de presidente para levar o Brasil a um acordo “nunca antes visto na história desse país”. Todos salvos e tudo voltando como era antes. A corrupção se institucionaliza e poderemos ser tão bons politicamente quanto uma Venezuela. Mas o importante é que o mercado voltará a sorrir e o povo a comprar a prazo suas passagens aéreas. Todos “empoderados”, com bons cargos na máquina generosa, e uma miríade de confortáveis espaços de isolamento em suas peculiaridades...


O futuro, velho conhecido, é para nós pretérito imperfeito. 

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