segunda-feira, 11 de junho de 2018 0 comentários

QUEM É POLÍTICO? Paulo Cotias

QUEM É POLÍTICO? Paulo Cotias: Jornal do Totonho
segunda-feira, 7 de maio de 2018 0 comentários

Lições Políticas (Publicado no jornal Folha dos Lagos, edição de 05 e 06 de maio).




Por volta de 1830 a Inglaterra já fervilhava com os desdobramentos da Revolução Industrial.  Se por um lado o país se desenvolvia economicamente de modo acelerado, por outro ainda sofria com os desequilíbrios tanto inerentes ao novo sistema político/econômico. O problema da representatividade era um deles. Os distritos industriais mais desenvolvidos tinham uma representatividade parlamentar inferior  a de localidades com ínfima população e baixa relevância econômica. O proletariado, nesse tempo, não podia votar nem ser votado mas, como lhe interessava os possíveis benefícios de uma representatividade indireta, alia-se à burguesia em prol da Reforma Política. Com a vitória da proposta, foi abandonada pela mesma burguesia que apoiou. Aprendeu a lição. Os pactos entre o capital e o trabalho são frágeis como cristais. A conseqüência disso foi a criação do Movimento da Carta que, junto com os sindicatos, percorreu o país pedindo direitos trabalhistas como a redução da jornada de trabalho para 10 horas diárias e, entre outras demandas, o direito de votar e ser votado. Para isso, era necessário que os representantes eleitos pelo povo pudessem ter como se sustentar. Naquele momento a função parlamentar não era remunerada, possibilitando apenas que os mais abastados, de fato, controlem o poder.

Hoje ainda temos certas ilusões em nossa democracia. Trago à luz pelo menos três. A primeira é a de que ser remunerado para o trabalho político é algo errado. Não é. De fato, como na luta inglesa dos séculos passados, é o que possibilita que as pessoas possam dedicar seu tempo tendo em contrapartida como se manter já que suas atividades pessoais ou são impedidas ou restringidas por questões legais ou de mesmo de tempo. Acreditar que a política deveria ser gratuita é assumir implicitamente que só os mais ricos, que são donos de seu tempo, podem ocupar funções públicas. O problema são os excessos, as distorções e a mazela da corrupção. A segunda é a crença de que a gestão pública deve ser entregue ao setor privado através de seus partidos e representantes. A afirmação de que a gestão pública deveria ser como a de uma empresa é algo que só pode ser dito por quem desconhece por completo a teoria e a natureza prática da administração. É como voltar ao modelo parlamentar burguês da aurora do capitalismo, ou seja, quem controla o capital passa a gerir o Estado conforme os seus interesses imediatos. A relação dos empresários com o Estado, no nosso país é um tanto estranha. O Estado é visto como madrasta, como inimigo do crescimento. Entretanto, as renúncias e incentivos dados pela “viúva” são maiores do que todo o orçamento deste ano das pastas da saúde e educação. Nada mal.

O terceiro é a de todos os políticos são corruptos e a política é algo detestável de modo geral. Essa crença é a mais perversa. Ela afasta as pessoas qualificadas e mais capazes para contribuir para a gestão e desenvolvimento da coisa pública. Investir com salários e carreiras atraentes no setor, diminuindo o tamanho e o alcance da montagem paralela das estruturas de governo pode ser uma saída interessante. Mas precisamos ainda dar nosso voto de confiança. Não a anjos posto que não existem encarnados. Temos bons políticos que estão na luta para que as boas práticas prevaleçam mas é preciso atenção redobrada pois nessas horas surgem o moralismo fascista, vazio e violento e a tecnocracia esnobe, fria, sociopática. E eles tem adeptos até mesmo nas camadas que são seus alvos prioritários.

E, por fim, não deixarmos de votar. Nunca. É uma conquista histórica, lenta e que tem as cores do sangue dos mais pobres.

domingo, 22 de abril de 2018 1 comentários

Educação Finlandesa (Publicado no Jornal Folha dos Lagos - Edição de 21/22 de abril)



Quando o assunto é educação geralmente temos orgulho e surpresa em olhar para experiências bem sucedidas no exterior. Depois de tempos de louvor ao modelo sul-coreano, a vedete do momento torna-se a Finlândia. Não é para menos. O país nórdico encontra-se sempre nas primeiras posições do Pisa, avaliação internacional que mede o nível educacional de jovens de 15 anos nos países-membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Quando entrevistados, professores, alunos e gestores são unânimes quanto a uma palavra: Valorização. Infelizmente no Brasil a palavra valorização é desconhecida em seu sentido original. Confundimos valorizar com gostar, respeitar, falar bem. Para os finlandeses esse não é um sentido atribuído mas uma conseqüência do que, de fato, é valorização.

Valorizar é agregar valores. Parece óbvio mas é completamente diferente do que praticamos aqui. Podemos elencar o receituário deles, falando sobre o fato de praticamente toda a educação nacional ser pública e possuir padrões salariais altos para docentes, estimulando a carreira. Podemos prosseguir mostrando que suas escolas são bem equipadas, com horários compatíveis com a rotina cultural e biológica dos jovens e com currículos atualizados e ensinados de modo inovador. Podemos ainda insistir mostrando que seus gestores são pessoas que entendem, de fato, de educação. E concluir com uma cultura nacional que valoriza a educação e a escolaridade sob a forma de oferta de empregos bem pagos para quem se dedica a vida escolar e acadêmica. 

No Brasil achamos que copiar modelos é a chave do sucesso. O problema é exatamente esse, o de reduzir uma experiência social complexa, como a da Finlândia, para que se transforme em um “manual pedagógico” a ser costurado como o monstro de Frankenstein em nossas partes decompostas. Lá a educação não se tornou peça retórica para politicagem vazia, não se concebe por doutrinação social em favor de ideologias particulares e nem como uma mera pré-condição obrigatória perante a legislação. Lá há uma compreensão ampla, holística da educação como princípio de toda a organização social, cultural e econômica. A política, nesse sentido, cuida para que esses três pilares permaneçam sólidos.

Enquanto por aqui convivermos com a politicagem com a educação, transformando-a em mecanismo compensatório do empreguismo simplório, da outorga a gestão das pastas educacionais a notórios despreparados e do tratamento estrutural baseado na precariedade, no jeitinho, no adaptado, não seremos Finlândia. Enquanto nos preocuparmos mais em gerar pilhas e mais pilhas de documentos, diretrizes, resoluções, parâmetros, portarias, marcos e todo um aparato monumental de instâncias e vigias, tudo para conferir se a precariedade vai em boa ordem, não seremos Finlândia. Enquanto nossos políticos e  gestores de pasta tratarem a questão salarial do docente como uma piada de mau gosto, enquanto lançarem mão da prepotência, arrogância, ou mesmo da falsidade, fingindo compreender e estar ao lado de quem, na verdade, combatem com todas as forças para que seus privilégios pessoais permaneçam intocados, não seremos Finlândia. Enquanto o mercado, a economia não valorizarem monetariamente o estudo, estancando a exploração em nome do lucro, pagando cada vez menos aos mais escolarizados, desencorajando carreiras, não sermos Finlândia.

Seremos nós. O Brasil orgulhoso da sua educação pouca para muitos e seletiva, para poucos.

domingo, 15 de abril de 2018 0 comentários

Mudar para Permanecer (Artigo publicado no Jornal Folha dos Lagos de 14/4)


A política em nossas terras tem a peculiaridade de se modernizar de modo conservador. Dito em outras palavras, o que é inovador em nossas práticas tem apenas a forma, a aparência e o nome. No fundo, muda-se para conservar.

Um bom exemplo, para não dizer lição, pode ser aprendido dos nossos livros de história. Vivemos uma república que prometeu, na forma, ser a vanguarda transformadora de um império caduco, atrasado, com o ranço aristocrático dos “casacas”. Entretanto, deixando aqui as devidas ressalvas ao modelo de governança monárquico (o qual não tenho real apreço), podemos observar um fato curioso: Um imperador se aproximando de uma nova elite urbana e empreendedora, a abolição do trabalho escravo tendo em vista uma progressiva transformação das relações de produção, entre outros sonhos dourados que acalentavam um desejado Terceiro Reinado.

Mas aí veio a república, filha unigênita de uma quartelada do exército, misturada em menor parcela com as tintas quase inexpressivas dos ditos “pensadores” liberais. De liberal o movimento teve pouca coisa, de fato. Até porque não foi essa gente que pariu a criança nova da mudança, foram as camadas agrárias, escravistas, conservadoras, que sustentaram e, assim que puderam, tomaram o governo aos goles de café com leite, raivosas pelo abandono de Sua Majestade.

Ou seja, enquanto na Europa os movimentos republicanos vinham acompanhados do engajamento e participação popular e de uma efetiva transposição de poder e de concepção de Estado e de governo, nas Américas coube aos elementos mais conservadores realizar, com alguns pares apenas, a mudança de tudo que ameaçasse mudar o seu mundo.

Hoje sofremos desse mesmo mal. Há pouca mudança no horizonte. Vejamos o caso da prisão do ex-presidente Lula. Não há como esconder a seletividade de uma justiça que faz política. O jogo é para prender uns, soltar outros e inocentar centenas ou milhares. É a mudança que não muda, apenas rearranja o jogo. Mas daí a acreditar que Lula é um mártir inocente vai uma distância colossal. Negar que ele não esteve no epicentro de um sofisticado esquema de cooptação e corrupção generalizada envolvendo agentes públicos e privados é de uma ingenuidade quase infantil.

Agarrar-se a tese de que ele não é um homem falível e corruptível mas sim uma “ideia” que tirou milhões de brasileiros da pobreza, é assumir que a esquerda brasileira não é lá muito diferente da direita nas suas práticas, apenas mais eficiente nos seus efeitos. Sintetizar as possibilidades da esquerda no “lulismo” é inaugurar uma síndrome de Robin Hood (desconsiderando ainda que os ricos em seu governo não foram “roubados e nem sequer incomodados...). Pior é reduzir a crítica ao novo deus imolado de puro fascismo... É nessa hora que nos tornamos o que combatemos.

segunda-feira, 19 de março de 2018 0 comentários

O Coletivo da Estupidez




Há alguns pares de décadas atrás, no tempo em que as redes sociais virtuais eram sonho de ficção científica, Nelson Rodrigues chegara a constrangedora conclusão de que os idiotas são a maioria. Entretanto, naquele tempo, como bem nos adverte o historiador Leandro Karnal, eles tinham uma severa dificuldade de aparecer, de manifestar o conteúdo dos seus ódios, preconceitos, reducionismos e tudo mais. A internet e o advento das redes deram a esse segmento majoritário um canal livre e desimpedido para que, assustadoramente, nos cheguem clara e desafiadoramente às vistas. Para piorar essa situação, a grande cáfila dos idiotas já conta com programa político e seus respectivos representantes, já eleitos ou por eleger. A imbecilidade majoritária é um sintoma difícil de colocar em um só campo do saber. Podemos atribuir ao egoísmo de um narciso infantil mal resolvido, onde se deseja de modo arbitrário e violento fazer prevalecer uma visão de mundo distorcida e, com ela, todo o conteúdo simplório, distorcido e com uma carga de autoritarismo vista somente nas grandes tragédias da humanidade.

Lembro-me da filósofa Hannah Arendt quando acompanhou o julgamento do figurão nazista Adolf Eichmann, a convite de uma revista e que resultou em sua polêmica obra “Eichmann em Jerusalém”.  Em sua análise, o genocida não era tão ideologicamente vinculado assim ao antissemitismo entre outras premissas simbólicas do Partido Nazista. Era um burocrata eficiente e de capacidade abominável de cumprir as piores e mais perversas ordens como uma tarefa a ser cumprida. Foi enforcado. E por que ele assim procedia? A explicação não é tão simples mas pode ser entendida pelo que a filósofa chama de “banalização do mal”. 

Quando o mal é banalizado ele vira a solução. Ou melhor, ele pode ser visto como solução para outros males, desde que naturalizado na dimensão maquiavélica de que os “fins justificam os meios”. E ele é extremamente eficiente posto que nos cega para qualquer outra dimensão. Por isso, chamamos direitos humanos – uma conquista evolutiva da moralidade humana – em instrumentos de defesa de bandidos. É nesse caminho que trilhamos quando defendemos o que nos protege do estado de natureza hobbesiano, o todos contra todos, ao tirarmos do Estado-Leviatã o monopólio da força e da capacidade de regular a vida em comum e passar essa prerrogativa para que as pessoas portem livremente armamentos e possam atirar em quem bem entender. Afinal, todos sabemos que os “bandidos” não serão os únicos mortos.

Em um país como o nosso, violento da cabeça aos pés, ou seja, tem uma elite narcísica e violenta, uma classe média conservadora e violenta, e uma camada pobre imersa no cotidiano da violência como meio quase natural de sua vida, o que esperarmos quando uma vereadora, ativista dos direitos humanos é executada? Desvencilhamos o fato de quem era ela? Foi uma vítima asséptica do acaso da violência urbana? Estupidez sem tamanho. A bala que matou a Marielle foi direcionada a tudo que ela era sim. Pois o que produz “Marielles” são negras pobres, de periferia. As que convivem com o arbítrio e os abusos diários tanto de quem deveria protegê-las quanto dos que são produzidos pela profunda desigualdade para ser o que nós chamados de tralhas, bandidos e coisas assim. Em pleno século XXI ainda acreditamos que ser marginal é apenas uma opção, coisa de índole, como se o ser humano de Rousseau renascesse naturalmente bom mas sem a parte de que a sociedade o corrompe. Ele se corrompe sozinho e por que quer. E quem tem pena que leve para casa. Não é assim o discurso comum?

Sinto muito pela vereadora. A bala foi para tudo o que ela representa sim. No país do mal banalizado, podemos simplesmente tratar a questão como fatalidade. Podemos tentar fazer com que a moral da Marielle seja manchada com alguma mentira construída (e a história tem tantas a disposição...) para que o coletivo majoritário dos idiotas possam vangloriar-se com o famoso “ninguém morre de graça” ou “morreu pelas mãos dos bandidos que defendeu”.Ao que parece não teremos mais eleições. Teremos um confronto civilizacional. Só um dos dois lados passará. E se o lado do mal banalizado prevalecer, quem sabe Eichmann não seja mais enforcado.

domingo, 11 de março de 2018 0 comentários

Qual Jovem? (Publicado no jornal Folha dos Lagos de 10/3)




Com a aproximação das eleições voltamos a escutar uma dúzia e meia de discursos sobre a juventude, seu papel, sua importância, a necessidade de fazer parte da política. Entretanto o termo é tão genérico quanto tudo que dizem ser o tal receituário participativo. De fato o jovem não está tão longe da política assim. É necessário apenas compreender de que jovens estamos falando.

Por exemplo, para os velhos esquemas políticos os seus jovens são uma necessidade de apresentar uma novidade, uma nova cara, mas com tudo que pode representar permanência no poder. Para piorar a situação, os mimados novinhos conseguem ser ainda piores e mais danosos a sociedade do que seus predecessores. Explica-se. Os que conseguiram no passado formar grupos políticos razoavelmente bem sucedidos, utilizando para isso todas as artimanhas e práticas comuns ao nosso fazer político, o fizeram com algum grau de compromisso com seu espaço vital.

Porém, as crias naturais ou agregadas desses grupos, não foram acostumadas com a necessidade ou com a dificuldade em consolidar-se com algum legado concreto. São da geração que se deu ao luxo dos cargos fantasmas, das vantagens e benesses, da absoluta falta de necessidade de uma carteira assinada ou de um expediente com metas de produtividade. Ao emergir para a vida pública, o único compromisso dessa juventude é a manutenção do poder e, obviamente, enriquecer. E só. Não é possível estabelecer nenhum compromisso com esse tipo de jovem político. Não possuem visão além do cifrão. Na verdade, essa juventude não precisa nem ao menos fazer política, no sentido clássico, relacional do termo. Seus grupos já vem pagos e a “máquina” já vem ligada para que eles apenas pilotem sem maiores preocupações. Tudo cai facilmente no colo para que apenas possam fazer os acordos que mais atenderem aos seus caprichos pessoais.

O outro tipo de jovem é o das classes populares. Aqui, há os que vêm com etiqueta de preço e engrossam os exércitos de cabos eleitorais remunerados daqueles outros jovens que continuarão muito ricos a custa da pobreza dos que levam seus santinhos para as ruas e para as urnas. E há os que despertam para alguma criticidade, militância, posicionamento. Não se vendem. Não se corrompem. Querem discutir, mesmo que ainda de maneira um tanto enviesada, projetos e idéias. Mas esses são os jovens chamados de ruins, de manipulados, de maconheiros, de esquerdopatas ou coisas do gênero.

Claro que os jovens políticos dos velhos esquemas não podem parecer o que realmente são. Instáveis, inexperientes, rasos e extremamente vingativos. Para isso usam seus prepostos, fazendo toda a maldade possível, mas vendendo uma falsa discordância entre os dois lados de uma mesma moeda.  É como agiota que diz discordar da tortura mas que não pode fazer nada, pois o torturador é “de outro departamento”.

Sendo assim, prestemos atenção quando o assunto é juventude e, especialmente, movimentos de juventude. Nem sempre temos grandes novidades para além da politicagem.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018 0 comentários

Capitão-do-Mato (Publicada no jornal Folha dos Lagos de 3/2/18)



Vamos iniciar em nossa coluna um ciclo de discussões acerca de um tema de urgente e extrema importância: Educação. Conversando com meus colegas docentes sobre os problemas que afetam a área em diferentes níveis de intensidade, pude revisitar algumas observações mais antigas e que continuam, assim como os problemas, um tanto atuais. Um deles, que abre nossa conversa pode ser denominada de “síndrome do capitão-do-mato”.

Na historiografia brasileira, o capitão-do-mato é uma bem conhecida figura. Ele vem de baixo. Geralmente recrutado dentre os mais pobres que sonham ter alguma ascensão social e ser reconhecido como alguém de alguma importância, mesmo que para isso tenha que exercer funções e fazer exatamente aquilo que destrói a dignidade de quem, assim como ele, também “veio de baixo”, ou que pela condição de não possuir a liberdade, está ainda mais abaixo na escala valorativa da sociedade.

O capitão-do-mato é o mestiço pobre que tenta dar certo através de um único talento e um único mérito. O talento é o de saber escolher um bom senhor para que dele possa dispor para todo e qualquer desejo ou projeto, mesmo os mais sórdidos. Para isso, usa de seu único mérito, o de ser tão fiel enquanto durar o uso. Com isso, o capitão-do-mato amealha o medo dos mais subalternos, a quem tem que capturar, subjugar e maltratar a mando dos poderosos e o prestígio de um bufão entre esses mesmo senhores.

O que deixa o capitão-do-mato mais nervoso não é o quilombo, símbolo de resistência. Ele lhe dá uma boa oportunidade até. O de provar o quanto sua ausência de caráter pode desdobrar-se a ponto de fazer sorrir de satisfação os seus senhores. A resistência, para o capitão é uma prova para sua capacidade de espalhar o pior para que colha o melhor dentre os que podem continuar a lhe dar o que deseja. Quando questionado sobre o mal que faz a sua gente, o capitão faz a cena de ser humano, pode chorar, pode franzir a testa e esboçar uma ponta de cansaço em ser tão incompreendido em suas boas intenções quando sublima a vida alheia em troca da sua fama efêmera.


Infelizmente a gestão educacional brasileira faz jus a sua história. Sobretudo no setor público, na área da gestão, é raríssimo encontrarmos nos colegas professores a figura exponencial de um agente de transformação. Encontramos o velho capitão, cavaleiro de triste figura. Desse modo, só nos resta a luta. Organizada, firme, insistente, sem buscar nada além da vitória dos verdadeiros competentes. Assim os senhores do poder, ao menos enquanto o tiverem nas mãos, podem enxergar com mais clareza o que significa o fenômeno educação para o seu povo.
segunda-feira, 15 de janeiro de 2018 0 comentários

Os Dois Coronéis (Publicado no Jornal Folha dos Lagos de 13/1)

Não é incomum as pessoas qualificarem de coronelismo uma experiência política de domínio indesejado. Se por um lado é difícil crer num aspecto positivo, não obstante se faz necessário um ponto de inflexão: Nem todo coronelismo é igual. Sem maiores filtros vamos pensar apenas nos dois mais conhecidos, o urbano e o rural.

Podemos afirmar sem medo de errar que o coronelismo urbano é um produto deformado do rural. Em ambos temos a constituição de famílias políticas que vão emplacando de modo cada vez mais capilar os membros diretos, colaterais e associados da parentela. Da mesma maneira, nas duas modalidades temos o controle praticamente absoluto da coisa pública como uma extensão dos interesses privados.

Insistindo ainda um pouco mais nas semelhanças, temos a transformação da justiça, assim como todos os demais poderes e instâncias da estrutura republicana, como extensões de domínio, ou seja, basta que se tenha dinheiro, poder de fogo (aqui tomado de maneira literal), ou bons vínculos de reciprocidade para que se coloque a interpretação da legalidade dos atos sob o crivo da vontade pessoal. O resultado mais visível é o escárnio cínico dos mandatários quando confrontados com seus próprios malfeitos, cientes de que estão acima de tudo e de todos, portanto, com plena capacidade de justificar o que bem entenderem.

Sem prolongar esse olhar das duas faces no espelho, encontramos outra semelhança fundamental, a formação de currais. É muito importante que existam currais nessa modalidade de se fazer política. Entretanto, há uma baia para cada tipo de animal. Existe o espaço para os rebanhos do gado xucro, aquele que é importante no volume, mas facilmente controlado pelos demais animais de estrebaria: cavalos, cachorros e outros a quem se pode delegar algum poder.

Entretanto as semelhanças param por aí. E justificando o porque o coronelismo urbano é um furto pervertido do rural é forçoso reconhecer, sem nenhum mérito adicional – registre-se – que no coronelismo rural ainda prevalecem dois elementos completamente ausentes no urbano, o cuidado com as pessoas e, consequentemente, o zelo com a oferta do que elas precisam. É do brio do coronel rural cuidar, proteger... Uma contrapartida que mais se assemelha ao proletariado romano, aos magistrados e seus clientes, uma relação de contrapartida onde um apadrinha o outro e a troca de benefícios se dá na escala definida pela posição de um e pela necessidade do outro.

Já o coronel urbano possui um carisma cínico. Abraça e beija seu povo na mesma intensidade do que o priva do básico. Após a conquista do poder, ele não tem o senso da contrapartida, do compromisso, pelo contrário! Torna-se unilateralmente violento, arbitrário, comportando-se não como um dispersor de benefícios, mas como um saqueador insaciável. Se o prestígio dá aos coronéis rurais a continuidade e capilaridade de seu poder, aos urbanos só resta o uso da paga mercenária, da ameaça de mais terror e caos e da quase inevitabilidade de sua presença pela capacidade de produzir dor e escassez.


Os dois  não são desejáveis. Mas apenas um ainda se faz muito mais vivo e presente.
terça-feira, 9 de janeiro de 2018 0 comentários

O Ano da Sobrevivência (Publicado no Jornal Folha dos Lagos de 06/1)


Em 2018 a região vai vivenciar as eleições para prefeito. Pelo menos indiretamente. Isso porque praticamente não se observa no horizonte uma candidatura viável com interesse exclusivo na representatividade legislativa. Assim, mesmo que sejam eleitos, esses representantes vão “esquentar o banco” federal ou estadual apenas para turbinar um projeto político/eleitoral de um pouco mais adiante. Arriscaria o prognóstico que a região ficará sem representante na próxima legislatura, levando a compromisso com deputados “de fora” para que possam deixar algum espaço em seus redutos para olhar para nossas bandas. Isso não é novidade propriamente. Nossas terras já foram bons currais externos e essa vocação também pode se tornar a turbina eleitoral de 2020.

Seja como for, todas as prefeituras da região tem um tempo limite de seis meses para resolver suas pendências. O problema é o para que resolver. Aí se encontra a encruzilhada. No modo de fazer política à brasileira, o poder público se ajeita em função do calendário político, portanto, responde a projetos de poder puro e simples. Assim, qualquer melhoria será apenas melhoria, quando os tempos de hoje gritam por mudança significativa, por transformação, por abertura de espaços para pessoas não apenas íntegras como também absolutamente competentes no que fazem. Falta à política a noção de serviço. Político deveria se comportar como servidor e não como um ungido de cabeça coroada, a frente de uma corte de bajuladores interesseiros.

Com base em dados, indicadores e reunindo os cérebros certos, foram muitos os governos em todos os níveis e em todas as nacionalidades ao longo da história que constituíram projetos não apenas inovadores como também decisivos para o bem-estar de suas comunidades. Assim, conseguia-se enxergar uma identidade de grupo, uma noção de onde se parte e para onde se vai. O que mais vemos, no entanto, é um caleidoscópio de pequenas peças, se mexendo individualmente para dar alguma visão de volume ao todo. Mais ainda assim, peças soltas.

Acreditam os paranormais da economia, em sua vidência, que 2018 será um ano de melhora. Particularmente devíamos colocar a devoção em outros santos. É de uma inacreditável ingenuidade alguém conceber capitalismo sem crise. Portanto elas, cedo ou tarde, farão parte do processo. E como gestão é administrar a escassez para que todos possam ter algo de bom, são necessários talento, integridade e inteligência, mas, acima de tudo, planejamento. O que não é mais possível é tentar colocar roupas curtas em elefantes. E isso significa coloca o modelo político tradicional na berlinda;

Sim, pois para sobreviver ele precisa continuar a reproduzir suas práticas e, para isso, precisa de grandes recursos. Mas como esses recursos não são mais graciosos é preciso produzir essas condições. Só que para produzir essas condições os governos não podem mais ser o que são. Desse modo, manter as coisas como são exigem cada vez mais compromissos externos, loteamento de governos e tudo o mais que apenas servem para manter pessoas e não uma efetiva perspectiva de transformação e desenvolvimento.


Esse ano promete. Vamos apenas ver o que cumprirá.  
 
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